Pierrot e o Beijo da Morte

(Um conto de Gustavo Guilherme)



Quem criou o amor? Quem teceu suas artérias inquietas? Quem foi este louco que ousou arquitetar o mais complexo sentimento?

Ouvi dizer, lá pelas tantas da madrugada, numa conversa mole que tive com um palhaço com cara de deprimido na Esquina da Amargura que um tal de Pierrot fora o primeiro a moldar, dentro de si mesmo, o tal do amor.

Pierrot – contou-me o palhaço – sentou solitário em sua adega, danou a beber e, depois de ter-se embriagado o suficiente, cometeu o amor.

Segundo me disse o rapaz, Pierrot arrancou do peito um pedaço do seu próprio coração, misturou vinagre, uma medida cautelosa de Delícias-do-Bosque, duas folhas de Mais-Amarga e uma pitada quase insignificante de Sorriso em Pó. Juntou tudo e inventou de experimentar sua criação. 

Pierrot, então, apaixonou-se por Colombina, uma velha feia e esquisita, a quem ele mesmo enfeitiçou, transformando-a na mulher mais bela de todo Reino – bem vestida, coberta de jóias e eternamente jovem.

Em um dia normal como qualquer outro, porém, Pierrot, como era de costume, consultou o Homem Que Sabia o Futuro, que morava sozinho dentro de seus olhos, bem ao lado da Íris, e viu o que estava por vir: Arlequim, seu maior inimigo, lhe roubaria Colombina.

Como as previsões do Homem Que Sabia o Futuro jamais erravam, Pierrot enlouqueceu. Passou noites inteiras planejando um plano alternativo para seu futuro. Viajou quilômetros atrás das Fiandeiras do Tempo, contou-lhes o que deveria ser feito e voltou para casa.

Quanto lá chegou, encontrou Colombina perdida de amor por Arlequim, o Cafajeste dos Cafajestes – Senhor da Discórdia e da Mentira – que envenenou Colombina com um fruto embebido em veneno.

Pierrot encarcerou-se no topo do castelo, até o dia em que o plano entregue as Fiandeiras aconteceu: com o mesmo pedaço com o qual criara o amor, Pierrot criou um filho. A este filho deu o nome de Amor-Maior – homem forte e poderoso que só poderia ser morto com a magia mais cruel: o Beijo da Morte. No entanto, Amor-Maior deveria, segundo os planos do Pierrot, morrer em troca da liberdade de Colombina e, depois de morto, sua alma resgataria a dela, e viveriam felizes para sempre.

Eram quase cinco da madrugada e o palhaço jogado na Esquina da Amargura era incansável. No auge de sua história sobre Pierrot, Colombina e Amor-Maior, o palhaço vibrava sacudindo os braços enquanto me contava que o plano de Pierrot dera certo. Colombina estava livre para sempre.

Me adiantei, tentando terminar, sem o sucesso que pretendia, a história do palhaço: 

– E viveram felizes para sempre? 

– Não, meu senhor... Ó, que tristeza. A Colombina, recentemente, deixou Pierrot de lado e corre dia e noite atrás de Arlequim, fazendo suas vontades e realizando seus desejos. 

Engoli seco e me preparei para ir embora – aquela história, assim como muitas outras que vi e vivi, não teria um final feliz – a não ser que ainda não houvesse terminado.

Olhei nos olhos do palhaço, sujo e debilitado, coberto em papelão no frio da noite, e estendi a ele a mão direita:

– Desculpe-me, mas tenho que ir embora. Qualquer dia nos vemos pelas Estradas da Vida, senhor... como é mesmo seu nome?

Foi quando uma última lágrima começou a desceu pelo rosto do rapaz, mas parou pouco abaixo dos olhos – e ali ficará, até o dia em que o Tempo deixe de existir para sempre.


by GG

9 comentários:

Anônimo 28 de abril de 2010 às 09:08  

Esse vai estar no "Revoluções", GG????

GG 28 de abril de 2010 às 09:45  

Provavelmente não, Anônimo(a). =P

Anônimo 28 de abril de 2010 às 09:58  

Muito bonito GG...

Como diria o sábio Shrek:

"Esta história é como uma cebola, não por que faz chorar, mas por ter várias camadas!"

Um belo exercício de linguagem e meta-linguagem...

Nota 10!!

nEle

Rick Serrat 28 de abril de 2010 às 14:15  

Eu tive o privilegio de ler essa josa, que dizem ser um conto, para mim é um texto bem ecrito, mais já tem toda uma regra literaria para falar o que é conto e oq não é, fazer oq! Apenas das os parabéns para esse gordo contador de historias!

Anônimo 28 de abril de 2010 às 14:26  

"Gordo Contador de Histórias"!!! Então GG não é de Gustavo Guilherme é de Gordo Gump!! HAHAHAHAHAAHAH

GG 28 de abril de 2010 às 14:29  

Tinha que rolar piadinha... kkkkkkkkkkkkk
Amorim e Rick, seus gordos irrustidos.
HUahsuhuhAHSUHAUShuahuhh

=P

Anônimo 28 de abril de 2010 às 14:32  

Sou enrustido não, sou Gordo assumido!

E Gordo não é gente, é ponto de referencia!

- "Sabe aquela menina, perto daquele gordinho..."

heheheheh

GG 28 de abril de 2010 às 14:45  

kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk

Mudou minha vida, Amorim: EU SOU UM PONTO DE REFERÊNCIA!!!!!!!

huashuAHSUHAHSUhaushuahuhsuahUHUH

Ira Croft 29 de abril de 2010 às 09:31  

lindoooooooooooooo... lindo lindo..palmas para o texto!! \O/ \O/ \O/

Quanto aos coments da galera uahsauhsas Gordo Gump foi "fogo" pra não dizer outra palavra rsrs

Um amigo ja me disse que Gordo não é gente, é ponto de referência messsssmo!!!
rs

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